Telescópio espacial James Webb: um olhar para o passado em busca do desconhecido

A observação do céu foi e é muito importante na construção do conhecimento humano não só na área da própria Astronomia mas também no nosso modo de viver. Na antiguidade, os povos usavam as estrelas e as constelações para construir calendários, permitindo a eles saber a melhor época para plantio enquanto durante a época das grandes navegações eram o principal meio de localização. A observação do céu também evolui com o tempo. Ela mudou de patamar quando em 1609, Galileu Galilei, reinventou o uso do telescópio ao fazer suas próprias lentes e apontá-las para onde nenhum outro havia feito; para o céu noturno. Isto permitiu a Galileu descobrir fenômenos antes impossíveis de observar a olho nu como as manchas solares, o relevo da Lua, as maiores luas de Júpiter, as grandes concentrações de estrelas da Via Láctea, entre diversos outros. A partir desse ponto o ser humano iniciou uma nova era da observação astronômica, na qual o telescópio é o seu principal instrumento. 

Junto com a grande evolução tecnológica os telescópios com o passar dos anos ficaram cada vez mais potentes e em 1964 o astrônomo Lyman Spitzer, escreveu um artigo apontando e promovendo as vantagens de se ter um telescópio no espaço em relação aos telescópios terrestres. Inclusive, o telescópio espacial Spitzer, lançado em 2003 pela NASA, foi nomeado em sua homenagem. O mundo passava pela Guerra Fria, na época em que a ideia de lançar um telescópio ao espaço foi concebida. Essa ideia acabou sofrendo atrasos na sua concepção, porém a corrida espacial desempenhou o papel de continuar os esforços.

Após muitas diversidades e muitos atrasos em seu lançamento, que foi adiado diversas vezes, em abril de 1990 o Telescópio Espacial Hubble, um grande telescópio para luz visível e no infravermelho, foi lançado pela NASA. Hubble apresentou uma aberração esférica no espelho principal que parecia comprometer todas as potencialidades do telescópio, o que, porém, foi corrigida numa missão para a reparação do equipamento, em 1993. Hubble recebeu esse nome em homenagem a Edwin Powell Hubble, que revolucionou a Astronomia ao identificar que a velocidade de afastamento das galáxias é proporcional à sua distância.

O Hubble que até hoje continua a nos agraciar com imagens ricas em informação e beleza, foi e é de suma importância para astronomia e permitiu aos astrônomos resolverem os mistérios sobre o espaço e também levantou novas incógnitas sobre o mesmo, fomentando o estudo de novas teorias. O Hubble também desempenhou um papel importante na popularização da ciência com suas fotos de alta definição do espaço como a  Hubble Ultra Deep Field, onde ele captura a imagem do céu profundo com a presença de milhares de galáxias.

Imagem do céu profundo obtida com o telescópio espacial Hubble

James Webb

Apesar da importância do Hubble ele possui consigo certas limitações e com os grandes avanços tecnológicos, criou-se a necessidade da construção de um novo telescópio espacial, e para suprir essa necessidade foi desenvolvido em uma parceria internacional entre a  NASA, ESA e CSA o Telescópio Espacial  James Webb.
Webb é um projeto de 25 anos, renomeado em 2002, em honra a um antigo administrador da NASA, James Edwin Webb, que liderou o programa Apollo, além de outras importantes missões espaciais. Ele é 100  vezes mais sensível que o Hubble, seu antecessor e consegue detectar luz infravermelha geradas por galáxias quando elas foram formadas a 13,5 bilhões de anos atrás. Ele irá explorar questões fundamentais da Astronomia, como o universo em seus primeiros momentos, a formação das primeiras estrelas e galáxias e como surgiram os buracos negros.

Telescópio Espacial James Webb . Fonte: NASA

O James Webb foi lançado no dia 25 de Dezembro de 2021 no foguete Ariane 5 e partiu em sua viagem espacial partindo da Guiana Francesa com ponto de chegada localizado a 1,5 milhões de km da Terra, conhecido como segundo ponto de Lagrange (L2). Os pontos de Lagrange são posições no espaço onde a atração gravitacional do Sol e da Terra é equilibrada por forças orbitais, fornecendo localizações estáveis ​​para as espaçonaves. L2 segue a Terra em torno do Sol e Webb seguirá uma chamada ‘órbita de halo’ em torno de L2, enquanto L2 orbita o Sol. A própria Terra está a cerca de 150 milhões de km do sol.

Ilustrando explicando ponto de lagrange L2. Fonte: ESA

 A missão primária do Webb será a de examinar a radiação infravermelha resultante da grande expansão e realizar observações sobre os primórdios do Universo. Ele irá nos permitir determinar como e por que  nuvens de poeira e gás colapsam em estrelas ou tornam-se planetas gigantes gasosos ou anãs marrons, conhecidos como ciclos estelares, e sua excelente sensibilidade permitirá aos astrônomos investigar diretamente os primeiros estágios do nascimento das estrelas, conhecidos como ‘Núcleos protoestelares’. Vai estudar também um dos eventos mais energéticos conhecidos do Universo, as explosões de supernova, que são mortes explosivas de estrelas massivas Webb também vai estudar marrom anões: objetos astronômicos que são mais massivos do que um planeta mas menos massivo do que uma estrela. Esses fatores são o que nos vai permitir entender como e onde as estrelas se formam e morrem e como suas as mortes afetam o meio ambiente.

Observar no espectro infravermelho é a razão para o telescópio realizar estas tarefas, devido ao  Red Shift, o desvio cosmológico para o vermelho, e também devido ao poder de penetração que essa radiação possui em atravessar nuvens de poeira cósmica e galáxias. Outras faixas maiores de frequência tendem a sofrer mais interferência dessas partículas de poeira, pois apesar do universo imenso, pequenas partículas no caminho da radiação podem contribuir para a má formação de imagens. Isto permite a observação de objetos mais obscuros e frios.

Até o momento já foram investidos o equivalente a 9,7 bilhões de dólares. O projeto foi mais longo do que o esperado por conta da tecnologia e do processo de fabricação embarcado. Boa parte das peças teve que ser desenvolvida do zero especificamente para o JW. Isso se aplica, por exemplo, aos sensores de infravermelhos, os mais poderosos do mundo e aos motores elétricos precisos o equivalente para ajustar os espelhos em uma fração de 1/10000 do diâmetro de um fio de cabelo a uma temperatura aproximada de -220ºC. Além disso, o próprio processo de fabricação de cada etapa de cada componente foi muito complexo. Somente para se construir os espelhos, foram inúmeras etapas passando por vários estados nos EUA.

O James Webb nos permitirá à humanidade dar mais um passo para descobrir origens, como tudo se formou e o que mais nos espera, questões que eram deixadas apenas para as teorias e imaginação poderão ser melhor compreendidas. Nas palavras do vídeo de divulgação do telescópio veiculado pela NASA,

 “Webb vai olhar diretamente para as origens das nossas origens cósmicas… para revelar coisas nunca dantes vistas por nenhum telescópios”[1].

[1] Science with Webb: seeing farther / ESA